Entenda o uso de filtros em fotografia de paisagem

Um bom domínio de fotometria e saber escolher a lente certa não são os únicos detalhes importantes para garantir a boa qualidade da imagem na fotografia de paisagem. A utilização de filtros e tripés também podem ter uma enorme influência no resultado final. O especialista Príamo Melo aborda esses acessórios nesta terceira aula sobre o tema.

Por Gabrielle Winandy (Texto) & Príamo Melo (Texto e Fotos)

De interesse direto na fotografia de paisagem, há cinco tipos de filtros fundamentais: ultravioleta, polarizador, de densidade neutra, colorido e infravermelho. O filtro ultravioleta (UV) serve para filtrar a radiação de mesmo nome. Em tese, o filtro UV visa reduzir aquela espécie de névoa que aparece na imagem, em dias ensolarados, que atenua seu contraste. O efeito do filtro, porém, é pequeno e quase sempre não faz muita diferença, segundo Príamo. A maioria dos fotógrafos o usa para proteger o elemento frontal da objetiva fotográfica – assim, se, eventualmente, o filtro for danificado, isso teria uma consequência menos danosa do que o prejuízo com a lente propriamente dita. Já os filtros coloridos servem, como seu nome sugere, para colorir uma cena. Assim, existem filtros que podem deixar a cena mais quente, com uma tonalidade mais amarelada, por exemplo, ou mais fria, com um tom azulado. Esses filtros, porém, são pouco usados por fotógrafos de paisagem. Príamo prefere dar mais destaque às cores verdadeiras da cena fotografada.

Os filtros polarizador e de densidade neutra são os mais usados na fotografia de paisagem e, na opinião de Príamo, indispensáveis a quem quer atuar no segmento. O polarizador é importante porque aumenta a saturação de azul do céu e, assim, realça seu contraste com as nuvens, além de eliminar, total ou parcialmente, reflexos em objetos não metálicos, como vidros, folhas, água e rochas, por exemplo. Assim, eliminando reflexos, o filtro polarizador pode produzir uma leve saturação de cor, deixando a cena mais vívida e intensa.

Polarizador

Há dois tipos de polarizadores: o linear e o circular. Essa denominação se refere à forma como os raios de luz deixam o filtro, após filtrados, e não ao formato físico do acessório. O linear é usado raramente hoje em dia porque desregula o sistema de autofoco de câmera digitais. No caso do polarizador circular, ao contrário, esse problema não existe, sendo assim aquele recomendado para a grande maioria dos usos em fotografia. Coincidentemente, os polarizadores circulares são, de fato, fisicamente redondos, e se acoplam na frente da lente por um mecanismo de rosca.

Enseada de Botafogo, Rio de Janeiro. Dados técnicos com polarizador: Nikon D300, Nikkor 70-300mm @ 70mm, ISO 400, f/5,6, 1/640s, medição matricial, captura em RAW, filtro polarizador, câmera apoiada com as mãos. Dados técnicos sem polarizador: Nikon D300, Nikkor 70-300mm @ 70mm, ISO 400, f/5,6, 1/3.200s, medição matricial, captura em RAW, filtro polarizador, câmera apoiada com as mãos.

Diferente da maioria dos outros tipos de filtros, o polarizador precisa ser girado para que tenha efeito prático. Uma vez instalado na frente da lente, sua parte mais externa pode ser movido através de um anel giratório, sendo assim possível aumentar a intensidade de seu efeito. Não há uma fórmula exata para saber o quanto o filtro deve ser girado. De acordo com o Príamo, você pode parar de mover o anel quando perceber que chegou ao resultado que procura. É importante salientar que o filtro polarizador pode reduzir a luminosidade da cena em até dois pontos, já que parte da luz, efetivamente, é bloqueada. Em alguns casos, quando exposições mais longas são pretendidas, por exemplo, esse ‘efeito colateral’ pode ser até ser considerado útil.

O efeito do filtro polarizador no céu é máximo quando apontado para uma direção que forme um ângulo de 90ocom os raios do sol. Assim, por exemplo, ao meio dia, com o sol em seu ponto mais elevado, o efeito máximo do polarizador se dará nas porções de céu na linha do horizonte. À medida que apontamos o polarizador para outras regiões do céu, o seu efeito é gradualmente reduzido, a ponto de ser nulo quanto fotografamos diretamente o sol, por exemplo. Já no caso da eliminação de reflexos, na prática vale girar o polarizador e analisar o resultado. Muitas vezes não conseguimos uma grande redução dos reflexos, mas em outras o efeito pode aumentar bastante o impacto visual da imagem.

Algo a ser lembrado é que esse tipo de filtro não tem uma combinação harmoniosa quando acoplado a lentes grandes angulares. Príamo explica que, como o ângulo de visão das objetivas ultra-grande angulares é bastante elevado (podendo chegar a 114o, no formato full-frame), poderemos ter porções do céu em que o resultado do polarizador será intenso, enquanto que em outras porções sua influência será mínima, já que seu efeito máximo se dará nas regiões com ângulos a 90° com a direção da luz do sol, como discutimos acima. Assim, é típico ocorrer uma espécie de anomalia na imagem resultante: uma boa parte (o centro, em muitos casos) estará polarizada, enquanto que as outras (como as margens), não, deixando o resultado final com tons de luminosidade diferentes no céu.

Cachoeirinha no Jardim Botânico, Rio de Janeiro. Dados técnicos com polarizador (esquerda): Nikon D300, Nikkor 16-85mm @ 40mm, ISO 200, f/11, 30s, medição matricial, captura em RAW, filtro polarizador Lee 105mm, câmera apoiada em tripé. Dados técnicos sem polarizador (à direita): Nikon D300, Nikkor 16-85mm @ 40mm, ISO 200, f/11, 30s, medição matricial, captura em RAW, câmera apoiada em tripé.

Densidade neutra

Filtros de densidade neutra são divididos em dois tipos principais: i) aqueles que são cinza em toda a extensão, chamado apenas de filtros de densidade neutra (NDs), bloqueando como um todo a luz que é admitida através da lente, e ii) aqueles em que a parte cinza gradualmente se torna transparente ao longo de sua extensão, sendo assim chamados de filtros de densidade neutra graduados (NDs graduados). No segundo caso, apenas uma porção da luminosidade da cena será bloqueada. Esse filtros são chamados assim porque há vários graus – densidades – de intensidade de bloqueio de luz, e também porque não causam alteração alguma nas cores da cena fotografada, sendo assim neutros do ponto de vista cromático.

Pedra Furada, em Jericoacoara, Brasil. Dados técnicos (com filtro): Nikon D800, Nikkor 24-70mm @ 70mm, ISO 100, f/11, 60s, medição matricial, captura em RAW, filtro Big Stopper Lee bloqueando em torno de 10 pontos de luz, câmera apoiada em tripé. Dados técnicos (sem filtro): Nikon D800, Nikkor 24-70mm @ 70mm, ISO 100, f/11, 1/20s, medição matricial, captura em RAW, câmera apoiada em tripé.

A função do filtro ND é escurecer a cena como um todo, de modo a permitir a realização de longas exposições. Esse recurso se faz necessário porque, em muitos casos, existe luz em abundância na cena e, mesmo quando tentamos fechar o diafragma da lente, ainda assim não conseguimos exposições longas. Os filtros ND estão disponíveis em dois formatos: quadrado ou redondo. O filtro redondo é rosqueado na lente tal como fazemos com um filtro UV ou polarizador, podendo ou não ter um anel giratório para intensificar seu o efeito.

Já o filtro ND quadrado pode seu usado por meio de um prendedor, conhecido em inglês como holder, que por sua vez é acoplado à lente utilizando-se um adaptador. Príamo recomenda o uso do filtro quadrado, porque possibilita o uso combinado com outros filtros, especialmente os NDs graduados. O filtro ND, segundo o especialista, serve para produzir efeitos mais artísticos na fotografia, sendo usado quando o fotógrafo de paisagem busca interpretar a cena de forma mais livre e subjetiva, explorando a possibilidade de registrar o movimento da água, das nuvens, das folhas das árvores etc., através de exposições longas.

Uso de um filtro ND graduado atenuando o contraste entre o céu e a paisagem de forma que todos os tons da cena possam ser capturados.

O filtro ND graduado é usado para situações em que somente uma parte da cena está muito iluminada, porque isso cria uma situação de contraste elevado, que dificilmente será bem registrada pelo sensor da câmera digital. Em situações como essas, quando o fotógrafo privilegia a região da cena mais iluminada, provavelmente a região menos iluminada será registrada com sombras muito escuras. Por outro lado, quando as sombras são privilegiadas, é provável que o céu seja registrado com tons claros demais, eventualmente apresentando estouros de luz. Nesses casos, a parte cinza do filtro deve ser usada para atenuar a intensidade de luz da parte mais iluminada, permitindo assim que o sensor possa registrar melhor todo o intervalo de tons da cena. Vemos, assim, que, diferente dos filtros ND, os ND graduados têm um uso técnico, pois procuram atenuar as limitações tecnológicas dos sensores digitais ao lidarem com situações de alto contraste.

Há dois tipos de transição entre a parte cinza e a parte transparente dos filtros ND graduados: abrupta ou suave. A transição abrupta é usada quando o contraste é evidente e bem caracterizado, como, por exemplo, quando coincidem com a linha horizonte de uma cena. A transição suave é indicada para quando o cenário tem uma topologia mais intrincada, como quando estamos no meio de montanhas, árvores ou prédios, por exemplo. Assim, é típico que o fotógrafo de paisagem carregue em sua mochila um conjunto de filtros NDs e NDs graduados, com várias densidades de bloqueio, e apresentando transições abruptas e suaves. Isso acontece porque é a cena diante do fotógrafo, com sua características e dificuldades específicas, bem como sua ideia sobre como interpretá-la, que levará à escolha dos filtros apropriados.

Infravermelho

Assim como a radiação UV, que já discutimos acima, o espectro de luz apresenta também a radiação infravermelha (IR, do inglês, infra-red), que desde longas datas tem encontrado uso na fotografia. Na fotografia analógica, é possível encontrar películas que são sensíveis a esse tipo de radiação. As películas convencionais não são sensíveis, entretanto. No caso da fotografia digital, os sensores são intrinsecamente sensíveis a essa radiação e, por isso, a luz IR é deliberadamente bloqueada através de um filtro interno instalado na superfície do sensor digital, pois, se isso não for feito, alterações de cor podem acontecer na imagem final bem como desajustes com o sistema de autofoco da câmera. Uma característica desse filtro interno, chamado de “espelho quente” (do inglês, hot mirror), é permitir a passagem de uma pequena porção da radiação IR para o sensor, sem afetar a imagem final. Esse pequeno fluxo de radiação IR é, efetivamente, suficiente para a produção de fotografias infravermelhas, como veremos a seguir.

Há duas formas de realizar a fotografia infravermelha com câmeras digitais, a saber: i) utilizando um filtro infravermelho, que será acoplado na frente da lente da mesma forma como fazemos com um polarizador ou um filtro UV, para bloquear a luz visível, permitindo apenas a passagem de radiação infravermelha; ii) removendo o filtro interno e o substituindo por um filtro de luz visível, de forma que o sensor capte apenas radiação infravermelha. No primeiro caso, radiação IR em abundância será admitida através da lente, mas grande parte dessa radiação será bloqueada pelo filtro interno. Assim, o fotógrafo precisará realizar, necessariamente, longas exposições para registrar a cena, mesmo em situações de intensa luminosidade. Como característica positiva dessa alternativa, a câmera poderá realizar tanto para a fotografia convencional como infravermelha. No segundo caso, com a câmera convertida permanentemente para a fotografia infravermelha, tempos de exposição pequenos são possíveis, sendo essa uma característica positiva. A conversão de uma câmera digital para fotografar exclusivamente em IR é feita apenas por profissionais ou empresas especializadas nesse segmento, enquanto que a aquisição de filtros infravermelho convencionais pode ser feitos em lojas de fotografia.

A vista do Cristo Redentor a partir do Jardim Botânico do Rio de Janeiro foi capturada com a ajuda de um filtro infravermelho acoplado à objetiva da câmera. Posteriormente, foi convertida para preto e branco. Dados Técnicos: Nikon D800 com Nikkor 24-70mm @ 55mm, f/16, 121s, ISO 100, filtro IR Hoya IR72, captura em RAW, câmera apoiada em tripé.

A imagem resultante de uma fotografia infravermelha é, usualmente, bastante avermelhada. Recomenda-se que se fotografe em formato de captura RAW, que então será processado de acordo com o gosto ou interesse do fotógrafo. No caso mais clássico, a fotografia é convertida para preto e branco e ajustes de contraste são realizados. É possível, porém, que os canais de cor sejam manipulados de forma a produzir fotografias finais coloridas e muito bonitas, apresentando grande impacto visual. Se apenas o formato JPEG for escolhido, é possível se obter fotografias diretamente em preto e branco, desde que esse tipo de ajuste seja escolhido na câmera.

Tripé

Se a sua intenção é se tornar um fotógrafo de paisagem, é essencial que entre os acessórios indispensáveis esteja o tripé. Muitas imagens são captadas com tempos de exposição longos, de forma que qualquer tremor na câmera pode ser fatal para comprometer a nitidez da imagem. Príamo alerta para o erro comum, entre os iniciantes, de comprar um tripé sem referência ou muito barato: usualmente, essa escolha não é suficiente para produzir imagens com elevada nitidez. Um investimento em um tripé de qualidade pode fazer muita diferença no trabalho do fotógrafo de paisagem.

Os melhores tripés, considerando-se os quesitos leveza e robustez, são aqueles de fibra de carbono. Infelizmente, porém, são também os mais caros. Se não houver orçamento para essa tipo de tripé, a alternativa é optar por tripés de alumínio, que embora sejam mais pesados, são mais baratos e garantem uma excelente estabilidade. O ideal é que a altura máxima do tripé permita, após a instalação da câmera, que o visor da mesma esteja próximo à altura dos olhos do fotógrafo. É importante enfatizar que o tripé diz respeito às pernas propriamente ditas, e que o conjunto se completa com a cabeça do tripé, de escolha igualmente importante. Há vários tipos de cabeças, mas a mais popular e indicada, segundo Príamo, é aquela que tem o formato de bola (em inglês, ball head), porque permite mais flexibilidade e posições diferentes, sendo de manejo bastante simplificado. Se o tripé tiver um nível de bolha, melhor, pois serve para mostrar o correto alinhamento do tripé em relação ao horizonte.

Dentre outros elementos que são importantes para quem quer fotografar paisagens, destaca-se o cabo disparador, que serve para evitar que o fotógrafo precise tocar na câmera na hora de dar o clique, aumentando ainda mais a chance de obter fotos nítidas. Príamo também observa que uma mochila adequada, com capa de chuva (para proteger o equipamento da melhor forma possível), e um colete fotográfico, também são muito importantes. No caso do colete, por exemplo, em situações com piso molhado ou com bastante areia, o fotógrafo pode antecipar as lentes, filtros e acessórios que vai utilizar e já colocá-los nos seus bolsos, evitando assim o risco de molhar ou sujar com arreia a mochila e seu conteúdo.

Também pode ser uma boa ideia levar uma lanterna de cabeça para o caso de anoitecer enquanto a sessão fotográfica está sendo realizada, o que é muito comum na fotografia de paisagem, além de bússola e mapa dos lugares visitados, especialmente quando não se tem familiaridade com eles. Príamo sempre usa chapéu para proteger a cabeça de horas de exposição ao sol e um saco estanque para a câmera quando precisa se deslocar em botes e/ou lanchas para acessar algumas locações.

Texto originalmente publicado emem Fotografe: Técnica & Prática, edição 37, 2014: http://www.europadigital.com.br/fotografe-tecnica-e-pratica/37

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